
Como está a afetar as nossas crianças?
Nestes últimos meses, a nossa capacidade adaptativa está a ser posta à prova. Substituímos as reuniões presenciais, as conversas e jantares com amigos e família, por videochamadas ou video-conferências em plataformas virtuais que fazem a ponte entre as limitações do contato físico pelas conexões virtualizadas. Não há margem de dúvida que as tecnologias foram o nosso balão de oxigénio mas muitos de nós já começam a acusar exaustão mental. A “fadiga do Zoom” (ou qualquer outra plataforma de videochamada) é um assunto sério e que, tanto para adultos como para crianças, pode vir a tornar-se num problema.
Milhares de crianças estão a ajustar-se com as ferramentas tecnológicas e conhecimentos informáticos, acrescido da sua responsabilidade de aprendizagem académica que poderão ter de continuar – de forma permanente, ou intermitente nos casos de isolamento profilático – , para alguns, até ao próximo ano letivo! Muitos deles estão confusos, desorientados, desmotivados e tristes com toda esta situação.
Estarão fartos do Zoom?
Alguns especialistas afirmam que as video-chamadas ativam pequenas lembranças de como as coisas estão diferentes agora e relembram-nos de pessoas que perdemos temporariamente. As rotinas diárias mudaram, e ver os seus colegas, amigos, professores e familiares virtualmente podem afetar o seu humor. Jeremy Bailenson e seus colegas do Virtual Human Interation Lab da Universidade de Stanford explicaram, num artigo do Wall Street Journal, que a fadiga de zoom advém de uma mudança abrupta nas formas de comunicação, onde as plataformas do Zoom sobrecarregam-nos de pistas que não estão sincronizadas e que nos dificultam a inferência de significado causando uma sobrecarga cognitiva que nos leva ao cansaço. Aliada ao facto de que, nas relações que estabelecemos com os outros, não estamos em permanente observação e vigilância e o uso de plataformas virtuais “obriga” a manter um contato visual fixo e permanente conduzindo a uma exaustão de pistas não verbais. Num estudo anterior, Bailenson afirma ainda que o contato visual nas relações académicas (aluno – professor) para alguns alunos, acontece de forma variável, semelhante às aulas em regime presencial, embora para outros alunos, esse olhar era fixo e constante durante toda a aula. O impacto gerado nesses alunos que eram mais observados de forma contínua pelo professor conduzia a uma maior produtividade mas maior desconforto e exaustão após a aula.
Quer seja um adulto que se coneta virtualmente com colegas ou uma criança/jovem que vê o seu colega,professor e amigos em pequenas janelinhas num ecrã de computador, estão ambos susceptíveis à “fadiga do Zoom”!
As crianças podem ser afetadas pela exaustão virtual e as video-aulas com turmas grandes podem ser as mais difíceis de gerir. Os jovens conseguem estabelecer uma ligação entre o seu estado de humor e pouca energia às videochamadas, mas as crianças mais pequenas têm uma dificuldade acrescida de articular o que para eles é mais difícil. Fique atento a alguns sinais e mudanças de comportamento que podem estar a emergir e que refletem este cansaço intenso no seu filho:
– Resistência ou choro quando se aproxima a hora da videochamada, mesmo quando se trata de uma videochamada com amigos ou familiares;
– Irritabilidade ou birras durante as ligações on-line;
– Inquietação, dificuldade em ficar parado e manter a concentração;
– Discussões com colegas durante as videochamadas;
– Dores de cabeça, cansaço visual ou outras queixas físicas.
Se já reparou nalguns destes sinais no seu filho, saiba que existem algumas estratégias que podem fazer para tornar esta realidade mais fácil para as crianças/jovens gerirem.
Mas calma! Nem tudo tem apenas um lado negativo.
Este artigo tem a ver com saber o que é e como lidar com a “fadiga de zoom”. Os encontros e compromissos on-line têm as suas limitações e as suas potencialidades quando comparados com compromissos presenciais. As videochamadas e/ou video-aulas são uma forma diferente de comunicar e ainda estamos a explorar a sua utilidade.
Para algumas crianças, as aulas online podem trazer mais benefícios que aulas presenciais. Algumas investigações indicam que as pessoas com ansiedade social sentem-se mais confortáveis online, onde as interacções são vivenciadas de uma forma mais positiva e menos intimidante. Crianças com ansiedade social podem considerar que as intervenções em video-aulas ou conversas com colegas são mais fáceis de lidar quando não há uma pressão imediata que a comunicação face a face requer.
Deixamos-lhe aqui algumas sugestões que ajudam a aumentar a adesão do seu filho às video-aulas e minimizar a fadiga de zoom.
Dica nº1: Aumentar oportunidades de atividade física.
Torna-se desafiante, para muitas crianças, permanecer sentado numa secretária um dia inteiro, quando as aulas eram intercaladas por intervalos, bem como idas à casa-de-banho e beber água, por aulas de ginástica e por mudanças de sala de aula. Em videoaulas, as crianças não têm as mesmas oportunidades para se movimentar e isso pode conduzir a uma perda de energia, alteração do humor e ser mais difícil manter o foco atencional.
Pode ajudar o seu filho introduzindo atividades que fomentem movimento e lhe conduzam a uma quebra de uma atividade que é sedentária. Incentive o seu filho a sair do espaço de estudo, entre aulas, em vez de ficar somente à espera que a próxima aula comece, sugerindo esticar as pernas ou beber água. Na hora de pausa para o lanche, aproveite para dar uma caminhada no exterior ou jogar um jogo de tabuleiro. Outra forma de adicionar movimento é oferecendo-lhe um fidget spinner, que seja silencioso, e que pode usar mesmo estando sentado. Permite-lhe manter uma parte corporal em movimento sem perder a atenção na videoaula de Zoom.
Dica nº 2: Criar um espaço apropriado
Uma das vantagens das aulas on-line é a possibilidade de controlar e/ou modificar o nosso espaço. Podemos sentar e vestir de forma mais confortável, a comida está ao dispor e temos os nossos pertences por perto.
Tornar o espaço de estudo mais confortável vai permitir ao seu filho estar mais focado e disfrutar mais ter aulas através do Zoom. O ambiente dita a forma como nos comportamos. Se está a pensar fazê-lo, aqui ficam algumas dicas:
– Se o seu filho tem video-aulas no quarto, incentive-o a sentar-se junto de uma mesa ou secretária, em vez de ficar deitado na cama. A criação de limites físicos orientados para atividades escolares ajuda as crianças/jovens a preparem-se mentalmente para a aprendizagem.
– Quanto maior for o ecrã, maior facilidade o seu filho terá em manter-se atento. Os telemóveis são desaconselhados para aulas em plataformas virtuais.
– Posicione o computador do seu filho ao nível dos olhos de forma a reduzir a tensão e proporcionar um contato visual mais aproximado do nível do contato real. Para isso pode empilhar um conjunto de livros debaixo do computador.
– Instalar uma aplicação que bloqueie o acesso a redes sociais ou a outros websites durante o tempo de videoaulas para prevenir outras atividades, como jogar ou conversar online com os colegas, que podem ser muito tentadoras!
– Reduzir as distrações no ecrã do computador. Por exemplo, desligar as notificações de email ou de outras mensagens.
Dica nº 3: Seja exigente e reduza as ligações virtuais
No início da pandemia, grande parte de nós experienciou um imperativo social de uso de plataformas virtuais. Apesar da necessidade de contato e disponibilidade, é importante também ser-se seletivo. Depois de um intenso dia de aulas on-line, torna-se difícil para uma criança/jovem continuar com video-chamadas com amigos ou para atividades extra-curriculares.
Seja seletivo nas videochamadas e, conjuntamente com o seu filho, seleccione e dê prioridade aos encontros virtuais mais importantes. Isto irá fazer com que o seu filho conserve a boa disposição e dispenda a energia e atenção necessários para as atividades que realmente importam.
Dica nº 4: Pratique a compaixão e a bondade
As novas formas de aprender e de estar na vida trazem novas exigências às crianças, pais e professores. Praticar a compaixão e a bondade para todos nas videochamadas é vital e podem ajudar a atenuar as desvantagens do uso do Zoom. Se para o seu filho é difícil manter-se atento, uma ferramenta útil para permanecer presente é escutar o outro com compaixão e ser-se gentil por estar a compartilhar. Quando se é gentil e amável com os outros ajuda a tornar o ambiente melhor e gera respeito e empatia com o próximo. Esta estratégia pode exigir algum treino prévio da sua parte e, possivelmente, o recurso a lembretes durante as videoaulas.
Monica Justino Faria
Psicóloga Clínica
Equipa infantojuvenil
Oficina de Psicologia
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